sexta-feira, 28 de janeiro de 2011

Nova Era


Cataclismos meteriológicos, terremotos destruidores, desastres aéreos, deslizamento de terras, ondas gigantes, vulcões cuspindo lava fervente. Maldade humana alcançando níveis exorbitantes, indiferença de sentimentos, menosprezo ao próximo, drogadição alcançando níveis aviltantes, gerando violência social, agressão às crianças, idosos e mulheres. Guerras intermináveis sob impulsos escusos, busca da riqueza material a todo custo, do domínio geopolítico e tecnológico, corridas armamentistas.

Enfim, impossível elencar todas as desgraças que atingem a Humanidade, nos anos que iniciaram o século XXI até os dias atuais. Diante desse quadro tenebroso, questiona-se: O que será de nós? Os pessimistas consideram que a Terra se extinguirá através do impacto de um imenso meteoro, da mesma forma que acontecera aos dinossauros. Outros, ainda pessimistas, afirmam que a Terra se despedaçará sob a queda de imensas bombas nucleares, onde, sozinhas, teriam poderio para implodi-la, dizimando toda forma de Vida.

Para iniciar nossas reflexões, é necessário relembrar aos amigos leitores, que, segundo o Espiritismo, os planetas são divididos didaticamente em: 1) Mundos Primitivos; 2) Mundos de Prova e Expiação; 3) Mundos de Regeneração; 4) Mundos Felizes e 5) Mundos Celestiais.

O planeta Terra está no segundo patamar, qual seja, Provas e Expiações. Nesse estágio, existe a predominância do mal, onde as injunções provocadas pelo Egoísmo e Orgulho asfixiam seus habitantes nas malhas da maldade e da ignorância aos conceitos divinos. No entanto, é possível afirmar que, desde o início deste século, o Mundo dá um passo na Evolução, atingindo novo patamar. Para isso se efetivar, será necessário a separação entre os que desejam o mal daqueles que desejam o bem. Por isso Jesus afirmou que “os mansos herdarão a Terra”, após a separação do “joio e do trigo”. Ora, somente existem herdeiros quando há o falecimento. A figura utilizada por Jesus demonstra que a Terra sofrerá mudanças que darão a idéia de morte, onde um grupo será separado do outro. Porém, da mesma forma que o aniquilamento total não se dá conosco, Espíritos Imortais, também não ocorre com os planetas. O planeta Terra passará por mudanças extremas, naturais e sociais, antes de ocorrer o legítimo expurgo daqueles que continuarem optando pelo mal, que serão direcionados a um planeta que se aproxima da Terra, para recebê-los.

Alguns consideram que este planeta se chocará contra a Terra, no entanto, pela razão e lógica trazida pelo Espiritismo, sabemos que o planeta integrará o Sistema Solar, para receber os novos habitantes, direcionados da Terra para a atmosfera desse novo planeta, ainda no início da Evolução humana.

Nostradamus, grande visionário, previu diversos acontecimentos que efetivamente ocorreram nos dias atuais. Dentre suas previsões, estava a destruição terrestre no ano de 2012. Porém, hoje temos ciência de que não se trata de uma destruição física do planeta, onde os homens desencarnarão em massa, não sobrando qualquer réstia de Vida na superfície terrestre. A destruição que se refere Nostradamus é a destruição dos valores atrasados da maldade, da infelicidade provocada pela conduta egoísta dos homens, que, ao desencarnarem, serão encaminhados ao expurgo e serão substituídos por espíritos que já desejam apenas o bem, os quais reencarnação igualmente em massa para auxiliar o planeta a galgar o novo passo. Podemos verificar a chegada desses irmãos nas crianças com inteligência acima do “comum” para nós, onde, em tenra idade, executam verdadeiras sinfonias nos diversos instrumentos musicais, ou são gênios da matemática, física, engenharia e etc. Tais espíritos foram incumbidos por Jesus para auxiliarem na mudança do Planeta para melhor, alcançando novo patamar evolutivo. Por outro lado, os maus, hoje possuem a última oportunidade. Não mais reencarnarão neste planeta e, após o desencarne serão ajuntados e levados ao expurgo definitivo. No novo planeta, poderão se redimir de suas faltas, recebendo nova chance de auxiliar a raça que lá se encontra (da mesma forma que os egípcios, os maias, os astecas receberam o auxílio tecnológico e não moral dos espíritos expulsos de Capela) e, caso saiam vitoriosos, poderão retornar à Terra, já alterada pelos eflúvios de Amor.

Nesse ponto do artigo, sinto-me na obrigação de citar caso curioso que ocorrera com uma amiga de minha genitora. Para evitar qualquer problemática, não denominarei os componentes do caso.

A neta de uma senhora, amiga de minha mãe, aos 4 (quatro) anos de idade, olhou para sua vó e disse-lhe:

- Vovó, lá na Academia da criança é muito legal! Eu aprendo tanta coisa.
- Academia? Porque está dizendo isso?
- Porque eu vou na Academia da Criança, que fica muito longe daqui. Você não pode entrar lá, mas eu vou porque eu vim ajudar o planeta a melhorar.

Essa é apenas um dos acontecimentos que corroboram a tese aqui exposta. Inúmeros outros exemplos ocorrem diariamente em todo o Globo. Esses maduros espíritos, já dedicados ao Bem, estão reencarnando em massa, em todos os setores da Humanidade, para exemplificar o bom proceder, seja na riqueza ou na pobreza, no poder ou na simplicidade. Identifiquemos estes irmãos, e sigamos-lhe os passos, para finalmente alcançarmos a tão sonhada paz de espírito.

João, em suas narrações do Apocalipse (1:9–11), se diz arrebatado em espírito no dia do Senhor, ouvindo uma grande voz detrás de si, requerendo-lhe que registrasse o que veria num livro e enviasse às sete igrejas.

Para facilitar o entendimento, segue citação bíblica sobre o ocorrido:



“REVELAÇÃO de Jesus Cristo, a qual Deus lhe deu, para mostrar aos seus servos as coisas que brevemente devem acontecer; e pelo seu anjo as enviou, e as notificou a João seu servo; O qual testificou da palavra de Deus, e do testemunho de Jesus Cristo, e de tudo o que tem visto. Bem aventurado aquele que lê, e os que ouvem as palavras desta profecia, e guardam as coisas que nela estão escritas; porque o tempo está próximo.
— Apocalipse 1:1-3”

“O tempo está próximo”. Pois bem, há quantos séculos João teria registrado essa frase? Alguns estudiosos afirmam que o Apocalipse foi escrito em 79—95 dC. Tal afirmação demonstra a visão dilatada que os Espíritos Superiores tem em relação ao tempo. É como se 1000 (mil) anos correspondesse a um minuto para nossos irmãos em elevado estágio evolutivo.

Fala-se em uma Grande Tribulação que sofrerá o Mundo, ainda maior a que vivemos. Estamos nos aproximando ao fundo do poço. Tal figura de linguagem serve para identificar o “fundo do poço” moral a qual nossa Humanidade se entrega. Um poço profundo, o qual não existe água fresca em seu interior, apenas um lamaçal de inconseqüências e maldade. No entanto, tal não deve ser nossa visão perante a realidade físico-espiritual de nossa amada Terra. Não obstante a ação do mal, em suas hostes que arrebanham inúmeros seguidores, é necessário lembrar que o Mundo não está entregue, indefeso, à tais forças.

Como bem sabemos, Jesus governa a Terra, acompanhando-a em todos os seus aspectos, verificando as decisões tomadas por nossos governantes, a conseqüência social do desamparo à criança e ao idoso, a resposta das forças naturais perante as forças humanas, indiferentes quanto à sua preservação. O Mestre está ciente de todos os acontecimentos e sabe o que se passa nos coração de cada um de seus irmãos, filhos do Altíssimo.

Sendo assim, devemos retirar as lições do que ocorre atualmente com nosso planeta. À primeira vista, nos parece que realmente o Mundo está abandonado, totalmente sujeito às forças do Mal, que se vangloriam em dominá-la pelo poderio militar e físico. No entanto, sabemos que o Mal faz barulho, justamente para chamar atenção para si, egoístas e orgulhosos que são. Já o Bem atua em silêncio, exemplificando, através de suas atitudes, a verdadeira Vida que deseja nosso Criador para todos nós. Como bem o disse Jesus, “muitos serão os chamados, mas poucos os escolhidos”. Essa escolha não é feita ao acaso. Jesus  denominou os chamados como toda a Humanidade, que é chamada diariamente para servir ao Pai, amando ao próximo, exemplificando o Bem, atuando caridosamente em prol dos mais necessitados, seja financeira, seja moralmente. Diante disso, quantos realmente atendem seu chamado? Quantos atuam a favor do próximo sem desejar gratificação, de forma voluntária? Poucos, se comparados à população terrena. Esses poucos serão justamente os escolhidos por Jesus para habitarem a Terra após as grandes dores que marcarão o início de nova Era no patamar evolutivo terrestre.

Segundo as alusões proféticas, haverá uma grande tribulação, onde aparecerá o “AntiCristo”, que será aprisionado por Jesus no “Lago de Fogo e enxofre”. Após isso, se dará o Juízo Final e a separação dos eleitos e dos pecadores.

Pois bem. Adaptemos tais alegorias à linguagem atual, com as definições espíritas, para explicar o real sentido da visão de João: De grande tribulação podemos antever diversos acontecimentos, inclusive que já ocorrem atualmente. A questão da figura do Anticristo não deve ser interpretada como um ser, que detém todas as características da maldade, mas sim, a conduta de um conjunto de pessoas, que vão de encontro aos preceitos do Cristo. Assim, aqueles que praticam o mal, desconsiderando os ensinamentos do Enviado, podem ser considerados anticristos. Acerca do aprisionamento em regiões de dor e sofrimento, nada tem de novidade a descrição do local para onde são direcionados os que optaram pelo mal após o desenlace físico. O fogo simboliza o sofrimento e o enxofre caracteriza a nuvem espessa de pensamentos infelizes presentes nas regiões trevosas do Mundo espiritual. São o retrato dessa região, para qual serão direcionados a massa sofredora após o desencarne. Por fim, o juízo final seria a divisão, a separação entre os que optaram pelo bem, daqueles que optaram pelo mal. Essa separação será física, já que os rebeldes, renitentes no Mal serão direcionados a um planeta de Provas e Expiações, tal qual a Terra, porém, no período inicial da evolução, ou seja, no período primitivo.

Nosso Mestre nos observa, e aguarda de nós a melhor conduta perante as necessidades da Terra. Tenhamos esperança e confiemos na Vontade do Pai, que é infinitamente Misericordioso, dando todas as chances possíveis ao Mal para desistirem de suas condutas infelizes. Caso persistam nesse intento, suas próprias consciências indicarão o “castigo” necessário para o expurgo de todos os males cometidos.

Além disso, não achemos que estamos totalmente entregues ao acaso, onde reina a Lei do mais Forte, ou a Lei dos “espertos”, que presumem burlar os desígnios divinos através de seu intelecto, quando em verdade nossa inteligência ainda engatinha frente à Sabedoria de Jesus.

Procuremos verificar quais são nossas tarefas perante a sociedade, pois a ninguém é dado o direito de viver isolado do contato humano, pois se assim procedermos, estaremos perdendo bela oportunidade de resgatar as faltas do passado. Somente amando e servindo a Deus e ao próximo é que poderemos considerar-nos verdadeiros herdeiros da Terra.


Salvador, 28/01/2011.

quinta-feira, 27 de janeiro de 2011

Os Amantes de Beledina

Os Amantes de Beledina


Torrente despenca dos Céus, anunciando a chegada da primavera na antiga fortaleza de Beledina, Espanha. Rodeada de extensas montanhas e com os cumes mais altos da região meridional espanhola, tal comunidade fora fundada como fortaleza principal do Governo de Castela, no período em que as invasões bárbaras amedrontavam as fronteiras do Norte.

Vencidos os primeiros combates contra a invasão que ameaçava o domínio da região em que situa-se o palco de nossas narrações, a comunidade, antes fortaleza inquebrantável, tornara-se pacífico e calmo burgo, destino de inúmeros nobres que intentavam repousar em seus belíssimos campos, meditando com os olhares fixos na imensidão do Mar Mediterrâneo.

As chuvas freqüentes na época em que se passa nossa história deixavam um solo fértil e propício para o cultivo de inúmeras culturas agrícolas, proporcionando aos habitantes do burgo relativa tranqüilidade financeira e os extensos vales floridos tornavam o local porto seguro predileto dos casais apaixonados que para lá se dirigiam para trocar juras de amor eternas.

Não é diferente para os principais personagens de nossa trama que se inicia. Ambos, ocultados por imensa árvore situada na fronteira de dois imensos campos povoados de belíssimos girassóis, compartilham paixão intensa, trocando carícias e beijos apaixonados.

Apesar de figurar paradisíaco o local em que se encontravam, estavam completamente a sós, em virtude da dificuldade de se acessar o referido lugar pela extensa faixa de mata fechada que circundava os limites das propriedades em que se encontravam o casal em segredo, acompanhados apenas dos pequenos roedores que buscavam abrigo e das inúmeras espécies de insetos a beijarem as flores em busca do precioso néctar.

Cecília Rodriguez de Albuquerque Donázio e Castillo, bela senhora da burguesia espanhola, que mais se assemelhava a verdadeira ninfa, coroada com reluzentes cachos dourados que envolviam sua cabeça, a descer pelos ombros, com grandes olhos azuis profundos, lábios finos e nariz afilado, de pele alva e porte indefinível, envolvia o parceiro em abraço afetuoso, cobrindo-lhe a face de beijos.

Aquele que era objeto de suas mais sinceras afeições denominava-se Luiz Garcin, camponês simples, conhecido construtor no burgo em que residia, que auxiliava com seus serviços os diversos setores sociais daquela comunidade, edificando inúmeras construções junto à burguesia e reformando muitas propriedades das famílias nobres que visitavam aquele paraíso oculto pelas montanhas.

O motivo da busca de privacidade é de fácil constatação pelo(a) leitor(a) amigo(a), tendo em vista que o abismo social que dividiam os amantes não lhes permitiam assumir postura de feliz casal unido pelas bênçãos do matrimônio. No entanto, tal condição não configurava o único empecilho sofrido pelos personagens dessa história. O maior deles era que a Senhora Cecília já estava vinculada por matrimônio com o Conde Diego Rodriguez de Andrade-Nórbega, importante comerciante local, que tirava da terra fértil da região as imensas produções agrícolas, que levava aos burgos vizinhos, enriquecendo sobremaneira. A posição destacada que havia alcançado com intensas disputas comerciais com os estrangeiros abastados que chegavam para tomar-lhe o posto de principal fornecedor da região deram-lhe importante consideração na sociedade que fazia parte.

O título de Conde das terras de Vestache, situada ao norte do burgo de Beledina propiciou o matrimônio com Cecília, apesar da grande diferença de idade entre ambos, já que D. Diego, homem amadurecido pelas dificuldades que vivera, contava com 54 primaveras, enquanto que a nobre Senhora Cecília possuía recém-feitos 26 anos de pura angelitude.

À época do matrimônio, não houvera discussão acerca da vontade da filha sobre aceitar o pedido do Conde, que impressionara-se com a beleza da jovem Cecília. Prometida à D. Diego desde tenra idade, o vínculo matrimonial se deu tão logo a menina completara dezesseis anos de idade, apesar dos protestos e dos apelos da mesma aos seus pais, que a admoestavam com as atitudes de rebeldia, em virtude do pensamento que mantinham, voltado somente para a preciosa vantagem pecuniária advinda daquela união.

Nos anos que se seguiram, insuficientes foram os apelos da filhinha acerca da conduta do conde, que a enxergava apenas como objeto de seus prazeres, objetivando usar-lhe apenas para a satisfação das exigências carnais que seu corpo demandava, o que era contundentemente negado por Cecília, o que deixava D. Diego transtornado, e, alimentado pela cólera, surrava a pobre menina, trancando-a em seus aposentos para refletir sobre a possibilidade de satisfazer seus desejos mais asselvajados.

Totalmente indiferente aos sentimentos de afeição que necessitava a mesma, o Conde de Vestache passou a trancafiá-la em seu quarto por dias a fio, permitindo-a sair apenas para os passeios matinais aos domingos, em direção à Sinagoga, para manter as aparências diante do pequeno Burgo de Beledina.

Grades foram colocadas às janelas de seu quarto de repouso, que passou a ser sua fortaleza íntima de intensa solidão. Sua única companhia era Ana, velha criada da família Andrade-Nórbega, que acompanhou todo o martírio da ama desde a sua mudança para aqueles sítios.

Em algumas raras oportunidades, D. Cecília conseguia burlar a segurança de seu próprio aposento, adentrando numa das carroças utilizadas para passeio e dirigindo-se para a casa de seus pais, que ficava razoavelmente próxima à propriedade de seu esposo. Os seus genitores a recebiam receosos, temerosos pela chegada de D. Diego, que sempre fora implacável acerca das fugas de sua jovem esposa.

Não havia saída. Sempre que descobria a fuga, o Conde de Vestache demandava o lar dos sogros, em busca de D. Cecília, montado em seu veloz cavalo de cor alva. Ao chegar, com o trotar inconfundível de seu jovem eqüino, agia com austeridade, exigindo o retorno da jovem, que, apesar dos protestos, não podia lutar contra a força daquele homem que a carregava de volta para cavalo, diante do olhar perplexo de seus pais, já idosos e que nada podiam fazer, face os costumes da época, que transferiam tal poderio ao marido, após esposar sua filhinha.

A conduta de D. Cecília apenas provocava mais ódio à D. Diego, que a forçava a ficar cada vez mais dias em seus aposentos, após espancá-la impiedosamente.

 - Jamais amei-o, aquele detestável homem! – dizia cheia de rancor a jovem Cecília a seu amante – Anos de melancolia e infelicidade atingiram-me o ser desde aquele maldito matrimônio, meu amado Luiz! Somente a tua presença consegue acalmar meus sentimentos mais profundos, trazendo a paz e a afeição que tanto tenho sonhado durante todos esses martirizados anos.

Com os olhos fechados, expressão de júbilo na face angelical, continuava Cecília a recordar os momentos que conhecera Luiz Garcin, nos primeiros anos de união com o Conde de Vestache:

- Amor meu, lembro-me como se ainda ontem lhe conhecera, sentado à sombra do Carvalho do extenso jardim que cerca a residência onde eu residira, quando tu coordenava a construção do antigo armazém, depósito das riquezas agrícolas que a terra nos presenteia! Pude avistá-lo da sacada de meus aposentos, quando ainda não vivia trancafiada! Seus lindos olhos a admirarem sua obra, com uma paixão nunca antes vista por mim, fascinou-me de pronto. Senti como que vós fostes o anjo prometido do Senhor para as minhas amargas horas junto do matrimônio infeliz que me encontrava.

Luiz, deitado sobre as pernas de sua amada, olhando-a com intensa paixão, fechara os olhos igualmente, relembrando o momento em que se encontrava na residência dos Rodriguez, de propriedade do Conde, onde apreciava a construção que administrava, quando, de forma repentina encontrou os olhos da jovem, que o estudavam fixamente. Sabia o jovem operário que aquela singela figura tratava-se de bela burguesa, prometida desde a juventude ao D. Diego, pois a sua beleza e simpatia era bem conhecida em todo o pequeno burgo de Beledina. No entanto, estranhara a atitude da jovem, que, mesmo possuindo companheiro, o observava, imóvel, sem ao menos disfarçar a admiração que lhe dominava. Apesar de receoso, por cumprir tarefa junto à residência do comerciante, que lhe contratara para administrar as obras do extenso galpão de armazenamento, venceu as próprias indagações e respondeu ao olhar da jovem, abrindo leve sorriso.

Como se despertasse de uma visão celestial, Cecília sobressaltou-se com a retribuição do olhar daquele belo homem, ruborizando-se e pretendendo fugir ao aposento em que repousava para fugir daqueles negros olhos que a fixavam. No entanto, Luiz chamou-lhe antes que pudesse evadir-se. Apesar de temer a situação, acatou ao chamado, permanecendo à sacada, imóvel. Luiz Garcín aproximou-se, olhando-a do jardim e perguntou se aquela bela senhora não gostaria de descer e acompanhar-lhe na finalização do galpão que estava construindo, para que a mesma desse uma opinião feminina acerca da construção.

Jamais D. Cecília aceitaria tal convite atrevido de um camponês, mas se via completamente perdida diante do charmoso Luiz, que insistia para que descesse. Acabou acatando o pedido, reforçando a própria consciência com a idéia de que seu marido estava em viagem de negócios, o que não traria problema algum dar uma olhada na construção recém inaugurada.

Palestraram, então, o casal apaixonado, identificando diversos sentimentos e gostos próprios, aumentando cada vez mais o desejo de um contato mais direto. Foi então que Luiz lamentou a ausência da ex-esposa, que morrera já havia alguns anos, e que sempre opinava acerca das construções que fazia. D. Cecília, então, ruborizada, opinou sobre a excelência dos detalhes que sua obra ostentava, levando Luiz à fascinação total perante aquela mulher. Questionada acerca da vivência conjugal, D. Cecília confessou, com um olhar cabisbaixo e envergonhado, que era infeliz, sofrendo ao lado daquele que fora prometido à ela quando não podia sequer expressar sua vontade com palavras. O camponês Luiz espantou-se com a notícia, mas não pôde disfarçar a satisfação em saber que a mulher, objeto de seus desejos apaixonados, vivia forçada ao lado do esposo.

Despediram-se ambos, prometendo um reencontro. Aqueles rápidos momentos entre as duas almas já lhe foram suficientes para dominar suas mentes por longas semanas, as quais tinham sonhos felizes, de intenso amor e afeição, despertando, ambos, com uma vontade irresistível de reverem-se.

E assim, com o tempo, Cecília e Luiz começaram a buscarem-se ambos, em sonhos enternecedores. Ela, após negar as investidas do marido com mais veemência do que antes, tendo Luiz a povoar seus pensamentos, passou a ter uma condição de verdadeira cativa em seus aposentos e, por isso, não poderia sair em busca de seu amado, porém, Ana, sua fiel criada, que lhe compartilhara as emoções desde o fatídico dia do casório infeliz, já tinha ciência dos desejos da ama, buscando informações sobre o fiel construtor. Para sua posição, não fora difícil achar a residência de Luiz, que se fixara frente à famosa praça de Dom Castro, no centro do burgo espanhol, após enviuvar, vítima que fora sua esposa da peste que invadiu o burgo nos primeiros anos daquele século.

Ao relatar tais informações para sua afetuosa patroa, a mesma rejubilou-se ao confirmar a ausência de empecilho matrimonial do objeto de seus desejos, Luiz, que nutria o mesmo sentimento de afeição à D. Cecília, aguardando um reencontro que não tardava. Foi esse sentimento que incendiou os refolhos d’alma de Cecília, a qual não conseguia mais antever outro futuro senão aquele junto dos braços de Luiz, apesar dos perigos que carregavam tais intenções, além da distância social imposta a ambos.

Questionada pela serva acerca da traição a que intentava cometer, Cecília justificava-se, afirmando que não suportava mais o casamento infeliz, onde sofria diversas limitações e, pior, apanhava quase que diariamente, diante da negativa de deitar-se com aquele ser impiedoso que tivera a infelicidade de ligar-se pelos laços matrimoniais.

- Repugno aquele velho! – dizia sempre Cecília, quando questionada pela criada sobre a possibilidade de trair a instituição do casamento, cedendo ao objeto de tentação que lhe constituía Luiz – Detesto cada segundo de carícias que aquele infeliz me força a suportar quando se encontra animalizado pelo fogo do prazer carnal! Se pudesse, eu mesma o mandaria para bem longe, sentindo-me livre para buscar meu verdadeiro amor, meu anjo enviado por Deus para aliviar meu sofrimento junto do maldito D. Diego!

Apesar das fortes palavras ditas pela senhora, a mesma não tinha tanta frieza nos sentimentos, pois jamais deu vazão à idéia do assassínio, que poderia livrar-lhe do marido, estando livre para dedicar-se ao amor sincero de Luiz. Ainda que sua serva Ana a lembrasse do testemunho que a patroa deveria dar, aceitando sua condição junto ao marido, que fora destinado a ela pela vontade de Deus, D. Cecília classificava a serva como tresloucada, que não tinha capacidade de compreender os verdadeiros laços de amor.

Cumpre ressaltar neste ponto da história que Ana sempre fora cristã, recebendo educação religiosa de uma instituição de freiras dedicadas à formação de jovens carentes. Diante da situação difícil que vivia sua ama, sempre procurou acalentá-la com as mensagens de Jesus para os corações aflitos, afirmando que não deveria ela desrespeitar os laços matrimoniais, deitando-se com um homem, senão seu esposo. Compreendia sua patroa, que, na condição que vivia não poderia corresponder às vontades do Conde, já que as humilhações eram muitas, porém, entregar-se a outro homem era inadmissível para os seus valores cristãos.

Além disso, lembrava à sua amada amiga que D. Diego, apesar do que fazia, jamais fora visto em companhia de outra mulher que não fosse a esposa. Jamais dera motivos para que qualquer pessoa desconfiasse de sua fidelidade à D. Cecília e, não obstante trancafiá-la em seus aposentos, jamais demandou casas onde predominavam a devassidão, no exercício da prostituição.

D. Cecília permanecia surda aos conselhos de Ana, alimentando cada vez maior desejo em conquistar Luiz, objeto de seus mais íntimos desejos de mulher. D. Diego nada desconfiava, continuando a administrar seus negócios.

Assim, de forma a receber investidores, velhos amigos comerciantes e sua própria parentela, D. Diego resolveu reformar o salão de festas para receber seus parentes abastados, a conhecida família Andrade-Nórbega, além daqueles acima discriminados. Tais encontros, que eram realizados periodicamente, sempre continham abastança de alimento e bebidas diversas, fazendo com que suas festas fossem conhecidas por todo o hemisfério Sul de Espanha, entre os burgueses de renome.

Dessa forma, para reformar o referido salão, requisitou ao seu servo mais fiel, o Sr. Marcel, que procurasse o melhor construtor e reformador do burgo de Beledina. Assim o fez tal servo, trazendo à presença do seu senhor o nosso conhecido Luiz Garcin, que se dirigiu junto do Conde para o salão de festas, que situava-se num dos jardins imensos daquela bela propriedade. Indicando todas as reformas que seriam necessárias para que a festa fosse mais uma vez comentada em todos os cantos daquele Reino, Luiz despediu-se de seu empregador, prometendo voltar no dia seguinte com os primeiros recursos e com diversos empregados de sua casa de reformas.

No dia posterior, quando Sol brilhava sobre os sinos da Catedral de Gartía Debaldino, a mansão encheu-se de operários, trazendo agitação e barulho à vida mansa e cheia de quietude daquele lar. D. Cecília, diante da preocupação do marido com as preparações para o grande evento, encontrava-se livre por alguns dias da insistência do esposo, e, por isso, podia caminhar livremente pela propriedade, em companhia de sua fiel serva, Ana.

Dirigiram-se, ambas, para o jardim predileto de D. Cecília para admirar a natureza e dialogar com sua serva, sem imaginar que a alguns metros daquele local, estava Luíz Garcín a administrar a grande obra, determinando as funções de cada empregado. Ao sentarem, maior surpresa não poderia ter dominado D. Cecília quando avistou o ser amado. Não acreditava que o destino teria trazido até si o homem que preenchia seus sonhos, seus mais íntimos pensamentos e desejos. O mesmo ocorrera com Luiz, que, ao virar-se, deparou-se com o olhar melancólico, mas apaixonado de D. Cecília. Não pôde igualmente segurar a forte emoção que sentia, tentando recordar de onde conhecera aquele olhar. Ao reconhecer D. Cecília, seu coração disparou como o de um adolescente dominado por intensa paixão juvenil e mal pôde continuar o serviço.

Dali a alguns minutos, D. Cecília pareceu esquecer-se de onde se encontrava, de quantos lhe observavam as atitudes, de sua condição de esposa de grande comerciante e, apesar de admoestada por sua serva, mandou informar à Luiz que ela o aguardava  no estábulo. A serva, apesar de totalmente contrariada, obedeceu, repassando a informação ao construtor.

Mal acreditando na suposta sorte que detinha em mãos, Luiz encaminhou-se ao estábulo, onde se deparou com sua amada a lhe esperar, radiosa, vestida com bela indumentária característica da burguesia, com jóias a lhe coroar o busto e os pulsos. Ao se aproximar, com o coração aos saltos, não pôde segurar a emoção e, considerando insuportável a distância entre ambos, enlevou D. Cecília com o braço, assumindo sua condição de homem apaixonado. D. Cecília tentou desvencilhar-se de forma sutil, porém, o que ela sempre sonhara estava ocorrendo, apesar de não ser da forma que desejaria.

Percebendo Luiz que D. Cecília correspondia a seus carinhos, procurou-lhe os lábios e beijou-a intensamente, provocando emoção nunca sentida pela mesma. Aquele beijo que durara alguns segundos, pareciam o selo da eternidade para ambos, que se amavam desde outras Eras, conservando Amor sincero desde outras reencarnações. Aqueles dois espíritos, que antes pareciam desconhecidos, redescobriam suas condições de eternos amantes perante a Eternidade.

Desejando permanecer por horas, dias, anos a fio, D. Cecília acabou cedendo ao temor de levantar suspeitas e demandou ao Lar, às pressas, deixando um Luiz extremamente eufórico, com as emoções à flor da pele. O camponês voltou aos seus afazeres, porém, não contavam ambos que sua imprevidência acarretaria em amargas conseqüências.

Sr Marcel, servo fiel do Conde de Vestache, a tudo acompanhara, percebendo a entrada da Senhora no estábulo e, posteriormente a saída dos dois apaixonados, um após o outro. Com o olhar contrariado diante da conduta que considerava devassa de sua ama, aguardou o retorno do seu senhor e relatou o que tinha visto.

D. Diego parecia um touro indomável, bufando impropérios e alimentando pensamentos infelizes de vindita contra os dois personagens que trouxeram a desgraça para seu Lar. Os pensamentos onde via a esposa nos braços de outro homem fizeram-lhe terrivelmente encolerizado, vez que ela jamais lhe permitiu saborear a sensação de tê-la entre os braços, a trocarem carícias amorosas, conforme todo casal deveria fazer.

No entanto, procurou acalmar os sentimentos, vez que não tinha certeza da traição da esposa. A informação trazida pelo servo denotava somente que ambos estiveram juntos no estábulo, mas não havia a certeza do ato de traição conjugal. Apesar de a probabilidade de ter ocorrido fosse enorme, D. Diego era um homem calculista e perfeccionista. Queria, antes de tomar qualquer providência, ter a certeza de que sua esposa lhe traía, entregando-se a outro homem. E tal idéia lhe corroia o espírito, fazendo com que raciocinasse na forma mais cruel de tratar o assunto se a traição viesse à tona.

Mandou que lhe chamassem a esposa, e, após fazer algumas perguntas, não suportou a mentira que saíam dos lábios daquela que tinha por mulher e, num impulso colérico, agarrou-a pelos cabelos e a levou até o estábulo, empurrando-a ao chão quando chegaram.

- Pois então reflita sobre o que dizes, aqui, no antro de indecência onde efetivaste a ignominiosa traição! – gritou encolerizado o Conde de Vestache para D. Cecília, trancando-a no local onde ficavam os suínos, que estavam agitados com aquela gritaria. Após desferir-lhe alguns tapas, rugindo como um leão desembestado, bateu a porta do chiqueiro com violência ao sair, deixando D. Cecília, humilhada, imunda, em prantos, sofrendo os golpes impiedosos do destino, que sempre cobra de todos os indivíduos a ofensa praticada, cedo ou tarde.

A senhora de Vestache não saberia dizer quanto tempo teria ficado naquele local fétido, em companhia dos animais imundos e dos insetos infecciosos que rondavam as fezes e o resto de alimento dos mesmos. Não suportando mais o cheiro que exalava aquele lugar, desmaiou sobre a palha seca que auxiliava a deixar o estábulo livre da umidade.

Algumas horas depois do ocorrido, desperta D. Cecília, em seu aposento de repouso, acompanhada de Ana, a fiel serva, que explicou à ama o que acontecera após a contenda. Retirada do estábulo, desacordada e imunda, D. Cecília fora trazida ao quarto pelo próprio D. Diego, que a deixou ao chão do aposento e, após repreender a serva pelo descuido de deixá-la caminhar sozinha pela propriedade, jogou-a igualmente no quarto e trancou a porta com estrondo, descendo as escadas e prometendo retornar.

Sua serva deu-lhe banho e limpou algumas feridas, fazendo-a repousar na confortável cama. Encontrava-se mais uma vez trancafiada a Senhora de Vestache, que caíra em prantos, agradecendo aos Céus por ter abandonado o fétido chiqueiro em que fora jogada.

A impiedade de D. Diego durara alguns dias, deixando a esposa sem alimentos nutritivos, condenando-a a alimentar-se somente com pão e água. Além disso, deixara-a trancada por dias a fio, sem permitir sequer as saídas matinais aos domingos em direção à Igreja local, que deixara de freqüentar, bolando planos terríveis para atingir sua próxima vítima: Luís Garcín.

A mente de D. Diego parecia um caldeirão fervente, onde se misturavam pensamentos diversos voltados apenas para vingar a honra ferida. No entanto, não destituiu Luís dos serviços que propusera, deixando-o administrar a obra do salão de festas. Nesse comenos, aproximou-se do operário, desejando conhecer-lhe os pontos fracos a fim de ter sucesso maior na concretização de sua vingança.

O destino, no entanto, preparava grande surpresa ao Conde de Vestache, D. Diego.

Sua esposa, D. Cecília, sorvera a última gota do cálice que experimentava. Após os últimos acontecimentos e com o coração totalmente entregue à Luiz Garcín, procurou bolar plano para escapar à sanha implacável de D. Diego. E, após confabular com sua fiel serva de suas intenções, rogou-lhe procurasse compreender sua condição e colaborar nos planos que havia edificado na mente.

Após alguns conselhos de Ana, que sequer adentravam à mente de D. Cecília, acabou a serva aceitando o plano, que consistia no seguinte: D. Cecília e Ana trocariam de vestes no próximo turno em que Ana teria permissão de adentrar os aposentos de D. Cecília para orar. Assim, entraria Ana e sairia D. Cecília, com as vestes de sua criada. Segundo a Senhora de Vestache não haveria qualquer desconfiança, vez que a estatura de ambas era praticamente idêntica, além do fato de que a serva tinha autorização para adentrar o quarto tarde da noite, objetivando realizar as preces antes do repouso do corpo físico.

E assim se fez. Ana, agora vestida com toda a riqueza de uma burguesa espanhola, aguardava o retorno da ama, sentada à cama da mesma, enquanto D. Cecília abandonava o cárcere do quarto, quando, em verdade, o plano egoísta de D. Cecília não guardava retorno àquele Lar que considerava amaldiçoado pela vergonha e pela maldade. Então, D. Cecília, vestida como simples serva, conseguiu evadir-se de sua mansão, dirigindo-se à residência de Luiz Garcín, guiando-se com um pequeno mapa desenhado por Ana.

Ao chegar ao local, bateu à porta de seu amado, o qual abriu-a e permaneceu perplexo à sua frente, mal acreditando que se tratava de D. Cecília, tão diferente naqueles trajes. Sua emoção, no entanto, não foi menor em virtude de tal motivo, enlaçando-a com um forte abraço ao fechar a porta.

Aquela noite foi considerada por ambos como a mais feliz de suas existências, pois puderam fruir de um amor verdadeiro, sem qualquer empecilho maior. Assim, entregaram-se ambos à conjunção de corpos e de espíritos, reencontrando a tranqüilidade de saberem-se amados, porém, sem conseguirem encontrar a paz de consciência daqueles que obedecem aos desígnios divinos. A união, apesar de sincera, transgredia a lei humana e também a Lei de Deus, pois, a fim de permanecerem juntos, traíam a confiança daquele que era legítimo esposo de D. Cecília.

No entanto, aqueles espíritos eram muito imaturos para compreenderem a Vontade dos Céus, pelo que responderiam ao ato de traição através do sopro implacável do destino, que a todos alcança, seja em que época for.

No dia imediato, Luiz confessou à D. Cecília que, desde o encontro de ambos, começara a edificar uma casa afastada do condado, a fim de para lá se mudarem, fugindo da perseguição de D. Diego, permanecendo no singelo lar até que conseguisse uma forma de adentrar o Mar mediterrâneo n’alguma embarcação comercial que os levassem a um porto de Paz, longe dali.

Notícias melhores não poderiam ser ditas à D. Cecília, que não intentava retornar à propriedade de D. Diego. E assim, antes do fim daquele dia, demandaram para a pequena casa construída por Luiz, a fim de aproveitarem-se um do outro, confabulando mil formas de conseguirem concretizar suas intenções.

No mesmo dia, tocado por sensível intuição, D. Diego subiu as escadas que levavam aos aposentos da esposa, onde, em verdade, encontrava-se Ana, a qual não conseguira adormecer, aflita que estava pela demora da ama. Porém, nada poderia fazer aquela serva, senão aguardar e orar, o que fazia fervorosamente, rogando à Jesus que amparasse o coração imaturo de sua ama, totalmente entregue a uma paixão que poderia acarretar terríveis conseqüências, as quais já percebia aquela sensível alma.

D. Diego, ao abrir a porta que levava ao quarto, não conseguira acreditar no que via. Sob o olhar espantado de Ana, ele pôde constatar o que havia ocorrido. Aos berros, chamou alguns criados responsáveis pela segurança da propriedade, ordenando-lhe que preparassem os cavalos, pois sua esposa fora seqüestrada por Luiz Garcín.

Após deixar um dos criados para supervisar Ana, trancafiando-a no mesmo quarto em que ficara, debandou a cidade, sem anunciar a ninguém o ocorrido, para que fizesse justiça com as próprias mãos.

Buscou informações do paradeiro de Luiz Garcín entre os moradores, porém, os mesmos, que muito consideravam o operário, sempre carinhoso para com todos, pronto para auxiliá-los sempre que possível, não informaram a residência do camponês, informando que o mesmo havia saído naquela tarde em direção aos estepes de Anteras.

Apesar da boa intenção dos moradores, acabaram por indicar exatamente o local aonde o camponês Luiz havia construído o lar para viver juntamente com D. Cecília. Com posse de tais informações, D. Diego raciocinou que o mais lógico que o maldito camponês poderia ter feito era exatamente fugir, covarde que era. Assim, debandou, juntamente com seus asseclas em direção ao Lar improvisado pelo camponês para se dedicar totalmente à D. Cecília.

Retornemos, portanto, ao início de nossas narrações, onde encontram-se deitados, sob frondosa árvore num belo campo, D. Cecília Rodriguez de Albuquerque Donázio e Castillo, a antiga senhora de Vestache , e Luiz Garcín, simples camponês que trabalhava como construtor na cidade palco de nossas narrações: Beledina.

Após relembrarem todos os momentos que os levaram até ali, se dirigiram ao isolado Lar, construído pelo apaixonado Luiz. D. Cecília, agora com indumentária simples, vivia as obrigações do Lar, deixando-o limpo e aconchegante. Ao anoitecer, Luiz resolvera se dirigir ao porto de Beledina para buscar alguma embarcação que os acolhesse, e, após isso, para não levantar suspeitas, retornaria à sua casa, prometendo retorno no dia seguinte, deixando a amada sozinha na casa construída em sua homenagem. Apesar do receio, perceberam que era necessário tal intento, e que chamaria menos atenção o fato de Luiz ir sozinho.

Anoitecendo, forte chuva começara a cair dos Céus, banhando a terra com o alívio da umidade e deixando a região em intensa escuridão. D. Cecília, que fora aconselhada pelo novo esposo a deixar a casa totalmente em sombras até que ele retornasse, obedeceu-o, adormecendo na escuridão.

Despertara D. Cecília angustiada. Ainda era noite, e a antiga Senhora de Vestache tinha pesadelos terríveis, onde cavalos avançavam em sua direção, montados por verdadeiros demônios assustadores, com máscaras de crueldade, implacáveis, portando lanças imensas que apontavam para seu coração, que palpitava freneticamente, sangrando abundantemente. Tais demônios berravam, irônicos, chamando-a de traidora, impiedosa, devassa.

Na escuridão da noite, D. Cecília não conseguira mais adormecer. No entanto, parecera que voltava a ouvir o trote dos cavalos montados por demônios impiedosos. O barulho dos cascos apressados parecia aumentar, até que D. Cecília percebera que não se tratava de um pesadelo, mas sim que haviam cavaleiros aproximando-se da casa em que estava, e, pior, reconhecia naquelas passadas inconfundíveis, o trotar inconfundível do veloz cavalo que pertencia à D. Diego, o esposo traído.

Com o coração aos saltos, abandonou a cama e correu para a saída, ainda descalça, com um temor que lhe fazia tremer os ossos e sensibilizar os músculos. Abandonava o local quando o trotar dos cavalos pareciam colados às suas pegadas. Em meio à escuridão, corria como jamais havia corrido. A chuva havia diminuído, mas em poucos segundos, D. Cecília estava totalmente encharcada, sem nada enxergar. Algumas vezes, raios iluminavam a noite, em flashs velozes, mas que permitiam-lha enxergar o matagal que a cercava, quase na altura dos seus ombros e o caminho em direção ao burgo. Os trovões estrondosos a faziam gemer de terror, mas ela jamais deixava de correr, sumindo em direção ao lar de Luiz.

Quando lá chegou, tentando ocultar-se na escuridão da noite, aproveitou as ruas vazias em virtude da alta madrugada em que se encontrava, e bateu desesperada à janela do amado camponês. Luiz Garcín estranhou aqueles chamados, mas abriu a janela, ajudando a amada a adentrar. Após relatar-lhe o ocorrido, resolveram ambos aguardarem o amanhecer para fugir. Não havia mais esperanças.

Ao amanhecer, após D. Cecília trocar de vestimenta e tratar das feridas de seus pés, se questionaram: Para onde iriam? Não havia opção. Certamente o Conde de Vestache teria emitido ordem para fiscalizarem o porto e qualquer saída, e, em breve encontrariam o reduto onde se encontravam.

Foi então que D. Cecília teve uma idéia ousada. Iriam ambos para o reduto de amor onde se encontravam às ocultas, a frondosa árvore nos limites dos campos de margaridas, lugar deserto, de difícil acesso. Apesar de temer, Luiz não teve opção senão concordar, acompanhando a nova esposa, a passos rápidos até o caminho tortuoso que levava ao referido campo. Ao chegarem, deitaram-se à sombra da velha árvore que serviu de lar provisório para aqueles corações amargurados. Conseguiram adormecer ambos, braços dados e completamente felizes por dormirem agarrados um ao outro, como dois jovens apaixonados.

O que seria aquilo? Cecília não conseguira distinguir. Sua visão estava enevoada. Com leve torpor, procurou abrir os olhos para fixar aquele objeto parado à sua frente. Quando finalmente conseguira distinguir o objeto, o coração saltou-lhe à boca. Todo o trajeto da fuga desesperada que fizera com que ela e seu amado chegassem à sombra da frondosa árvore que os cobriam veio à sua mente, provocando-lhe leve tremor. O objeto à sua frente eram as conhecidas botas de caça do antigo esposo, D. Diego Rodriguez de Andrade-Nórbega, que estavam imóveis, a poucos centímetros dos corpos dos amantes entregues à mansuetude da paixão verdadeira, entorpecidos de amor.

D. Cecília levantou a cabeça lentamente, procurando reconhecer o antigo verdugo e, quando conseguiu encarar-lhe a face, viu o Conde de Vestache encarando-a, impassivo. No entanto, seus olhos pareciam não enxergá-la. Estavam imóveis, fixos, arregalados e esbranquiçados pelo torpor da cólera em mistura com a dor da traição.

Ao olhar para o lado, a antiga Senhora de Vestache percebeu que Luiz Garcín despertava também. E então, ambos passaram a fixar D. Diego. Seu cavalo estava parado a alguns metros e seus servos estavam montados à uma distância relativa dos três.

Nenhuma palavra foi dita. A diversidade de emoções não permitia a nenhum deles manifestar qualquer palavra. Apenas olhares restavam. Olhares de temor, de ódio, de cólera e por fim, o olhar apaixonado dos jovens amantes, que se entreolhavam, parecendo adivinhar o desfecho da triste história.

D. Diego segurava antiga espingarda de caça, utilizada tantas vezes para abater animais que adentravam sua propriedade, ameaçando suas plantações. Agora, no entanto, pretendia o Conde utilizá-la para vingar seu coração amargurado e traído. Por isso, levantou-a lentamente, colocando-a em posição de mira.

Sob o olhar compassivo da antiga esposa, vacilou e pensou em desistir do ato ignominioso do assassínio, incentivado por forças espirituais presentes à cena. No entanto, a vergonha era excessivamente grande. Tinha que vingar sua honra, exterminar aqueles que não o respeitaram como marido e como Conde daquelas terras.

O casal, deitado ao chão, não reagia. Olharam-se, aguardando o término do conflito íntimo de D. Diego e perceberam que aquele era o último momento de suas existências, porém, pensavam que o reencontro seria glorioso após a morte e essa idéia os acalmavam.

Diante deste último ato de humilhação, D. Diego pressionou o gatilho, atingindo em cheio o peito do seu maior inimigo. Luiz Garcín recebera o tiro, que atingiu diretamente seu coração, fazendo-o expirar rapidamente, sob o olhar piedoso de Cecília. O segundo tiro não demorou. Desta vez, no entanto, era Cecília que o recebia, atingindo igualmente seu coração amargurado por anos de sofrimento e expiação. Nos instantes finais de sua desencarnação, pensara em Ana, sua fiel serva, que de certa forma também fora traída pela ama, pois D. Cecília prometeu-a que voltaria, porém, não cumpriu com sua palavra, deixando-a só, aflita e sem notícias.

Com o ferimento fatal no peito, olhou para seu algoz pela última vez, e o mesmo respondeu com um olhar frio e tenebroso, denotando imenso pesar e sofrimento no ato que acabara de cometer. Num último suspiro, antes de expirar diante de seu ex-esposo, Cecília conseguira dizer uma única palavra, mas que ecoou na alma daquele homem embrutecido pelo tempo por longos anos posteriores ao assassínio, trazendo-lhe reminiscências dolorosas:

- Perdoa-me!


Não se engane, querido(a) leitor(a), quanto à mensagem que a história traz, já que não se trata aqui de uma história de amor, onde o casal protagonista viverá as delícias da união eterna após o desencarne.

Como bem enxergamos na trama, Cecília infringiu normas humanas e divinas, tendo em vista que não respeitou seu companheiro, apesar de sofrer imensamente ao seu lado. Além disso, Luíz não respeitou igualmente as leis divinas, pois, sabendo do compromisso de Cecília, continuou a desejá-la, tomando-a do seu legítimo esposo.

Ainda que nos pareça legítimos os atos cometidos por ambos, não podemos olvidar que a Justiça Divina não erra de porta, ou seja, ninguém se vincula a outrem por acaso. O acaso não existe para o Espiritismo e, conseqüentemente, para os espíritas. Tudo tem um porque, tudo tem uma explicação, seja nessa encarnação, seja em outras.

O compromisso que Cecília e Diego tinham deveria ter sido reparado nessa encarnação sofrida que ambos viveram. Se realmente Cecília e Luíz se amaram, deveriam ter aguardado em Cristo a solução dos seus problemas, mas nunca agir com o objetivo de ferir outrem.

Além disso, Deus colocara Ana, a fiel serva, que sempre aconselhava a ama sobre como melhor proceder, jamais infringindo as leis humanas e ainda menos as leis divinas, onde ambas impediam qualquer ação infiel por parte de Cecília, que nunca dera ouvidos aos chamados cristãos através da boca de Ana.

A palavra de nosso mestre é clara no que diz respeito ao sentimento alheio. Jamais fazer com o próximo o que não desejamos para nós outros. Além disso, jamais desejar a mulher do próximo, como o fizera Luíz.

Sendo assim, cabe-me esclarecer o destino desses dois espíritos, diante da consciência divina, após o desencarne.

Após algumas reencarnações expiatórias, aonde ambos sofreram traições daqueles a quem tinham afeto, para que suas consciências se harmonizassem, dando o devido respeito à fidelidade conjugal e afetiva, reencarnaram novamente, vindo a se conhecerem na juventude.

Após alguns anos juntos, fatos imperiosos levaram-nos a se separar, por motivos educacionais e financeiros, mas continuaram se amando, cultivando tal sentimento, como namorados.

Hoje vivem relativamente longe um do outro, apesar de muito se amarem. Sofrem com tal distância, mas sabem, no âmago de seus seres, que sofrem tal restrição porque antes infringiram norma divina de fidelidade. Ou seja, quando reencarnaram para viverem distantes um do outro, infringiram a lei e forçaram a união. Hoje, quando poderiam ficar juntos, são forçados pelas circunstâncias a se amarem à distância.

A dívida criada perante o espírito de Diego terá que ser adimplida, aonde deverão recebê-lo seja em que circunstância for, cultivando o amor e a afeição por ele, para que novamente ele aprenda a confiar naqueles seres que antes o traíram.

A Lei Divina é implacável, e, ao mesmo tempo, misericordiosa. Deus não quer que soframos, mas quer que aprendamos a respeitá-Lo e a respeitar Suas Leis, amando ao próximo como a nós mesmos. Sendo assim, cultivemos em nossos corações a paciência para aguardar o momento certo da nossa felicidade conjugal ou afetiva. O que é nosso chegará gradativamente, à medida de nosso merecimento, esforço e renúncia a favor do próximo. Nunca através de transgressões à Lei Divina, ainda que aceitas pela sociedade em que vivamos. Amar é a chave! E se amar significa viver longe daqueles que temos afeto, para adquirirmos novos valores, que assim seja!

terça-feira, 25 de janeiro de 2011

Carnavalescos

Imensa mole reúne-se em larga via pública, numa das capitais de nosso Brasil para celebrar a festa onde costumou-se afirmar que a “carne vale”, originando o termo carnaval. No entanto, é preferível afirmar, diante do quadro tenebroso que se formava, que a carne nada vale naquelas circunstâncias, diante da desconsideração dominante no que concerne à integridade físico-psiquica-emocional daqueles que compartilhavam da referida festividade.

A multidão compacta e frenética se embriaga e exaltam ao som de batidas ensurdecedoras provenientes de imensos trios elétricos, que alimentam a insaciável necessidade de extravasar as energias dos envolvidos, olvidados que estavam dos valores morais e anestesiados nos sentimentos nobres para com o próximo, buscando única e exclusivamente o êxtase das sensações carnais e a satisfação de seus mais secretos desejos.

Indescritível quadro espiritual formara-se no local, somando aos encarnados milhares de outros desencarnados, tão envolvidos quanto os primeiros na exaltação da carne e de suas necessidades mais selvagens, contribuindo para o aumento exorbitante de miasmas perturbadores, que eram exalados das mentes dos milhares de foliões e contaminavam toda aquela região dedicada aos festejos.

Ambos os planos, numa interação que torna imperceptível a diferenciação entre os que possuem ainda o invólucro carnal e aqueles outros que já se encontravam desencarnados, formavam um verdadeiro exército em marcha, porém, sem a organização característica dos institutos militares, onde os foliões berravam, embebedavam-se, engalfinhavam-se e pareciam extasiados com a permuta de energias menos dignas.

Para retratar a psicosfera dominante, é necessário compará-la à nuvem espessa com coloração escura, sombria, deixando impressão constrangedora e nauseante para espíritos sensíveis que porventura viessem a presenciar o fato.

 Entidades dedicadas ao mal transitavam livremente em meio à multidão, gerando balbúrdia e desespero entre aqueles que atrapalhavam sua caminhada, através de chutes, palavrões e gestos extremamente ofensivos, pelo que eram imitados, inconscientemente pelos encarnados sintonizados na mesma vibração doentia.

Em alguns pontos daquela imensa multidão, notava-se a atuação direta desses seres desencarnados zombeteiros, onde provocavam brigas violentas entre os encarnados ao soprarem sugestões infelizes, desvios de conduta e tentativas desesperadas de satisfação de prazeres asselvajados, os quais gargalhavam quando viam suas idéias receptadas pelos encarnados e colocadas em prática pelos mesmos.

Além dessas ocorrências, na homogeneidade de condutas infelizes, se destacava ainda a interação sexual entre os participantes da festa, que mais se assemelhava a verdadeiro bacanal, onde não havia qualquer consideração ao sentimento de afeição e amor, priorizando-se a busca incessante de inúmeros parceiros, a trocarem beijos lascivos, carregados de exacerbada sensualidade, além dos gestos que imitavam a conjunção carnal entre os participantes.

Cumpre salientar ainda a contribuição amedrontadora que a utilização de entorpecentes diversos trazia à multidão, os quais ingeriam tais substâncias para atingir de forma mais completa a extrema euforia da comemoração, lesando seriamente o invólucro carnal e trazendo conseqüências dolorosas para o perispírito, o qual levará anos para recuperar-se, através de sucessivas reencarnações expiatórias repletas de dificuldades e limitações.

Tais condutas atraíam ao evento os tipos espirituais mais nefandos que se possa imaginar, que encontravam sintonia apta para a satisfação de suas intenções menos dignas, acoplando-se aos encarnados presentes e sintonizados com os mesmos ideais, fruindo de todas as sensações percebidas pelos encarnados.

Sem falar naqueles que se aproveitavam da balbúrdia para verem concretizados seus objetivos infelizes, assassinando friamente seus oponentes, os quais despertavam no Mundo Espiritual sem se aperceberem do ocorrido, confusos e desesperados, evadindo-se às carreiras sem rumo ou enlouquecendo diante da constatação do desligamento da máquina física.

Apesar da aparente dominação das forças do mal nesse quadro, não podemos olvidar que os desígnios do Alto atuam incessantemente a favor das criaturas, enviando-lhes verdadeiras caravanas de Amor, que montam postos ao redor da região desequilibrada, atuando em favor daqueles que desencarnam em situação deplorável e evitando maiores desastres no mundo terrestre.

Esquecidos das Leis Divinas que regem a organização e equilíbrio entre os seres, os participantes do carnaval extasiavam-se com o momento, sem mensurarem o resultado espiritual de seus pensamentos e condutas, que formavam um ambiente fétido e doentio, cercado por seres alienados e totalmente entregues à adoração da carne.

É nesse quadro terrível, onde constata-se o atraso moral dos habitantes da Terra, é que encontraremos Laércio, jovem rapaz totalmente entregue às baixezas morais retratadas nas linhas acima, misturado em meio à multidão, onde dança no compasso de uma das canções feitas especialmente para o evento, estimulado pelos gestos sensuais dos dançarinos, que ensinam coreografias depravadas, imitando o ato sexual animalizado.

Apesar da educação espírita desde o berço, Laércio desconsiderava os apelos de sua mãe, Dolores, para evitar as festividades infelizes, onde reinam a depravação dos sentimentos, o mergulho nas sensações da carne, regados a muitos litros de bebidas alcoólicas e substâncias ilícitas entorpecentes.

O rapaz, de belas feições fisionômicas aproveitava de tal condição para somar às suas anotações mentais o número de parceiras que trocava beijos, carícias e vibrações, para, após, disputar com os companheiros aquele que poderia ser considerado o vencedor.

Tal conduta fez-lhe afeiçoar um espírito de aspecto melancólico, com profundas olheiras, roupas imundas, repleto de substância que lembrava terra e que percorria todo o seu corpo espiritual, dando-lhe uma impressão assustadora. O referido habitante do mundo espiritual inferior andava com dificuldade, apoiando-se naqueles que lhe cercavam, caminhando, trôpego, em direção a Laércio, que nada conseguia antever.

No entanto, quando esta entidade aproximou-se de nosso jovem amigo, sintonizado que estava com suas emanações vibratórias asselvajadas, ligando-se intimamente à ele através de fios escuros e emanações mentais sombrias, Laércio sentiu-se em choque, estremecendo com o contato a tão  baixa vibração, porém, como compartilhava idéias com o parceiro desencarnado, continuou a abusar de seu corpo físico e, após surgir os primeiros raios solares, dominado por intensa fadiga, crendo-se acometido de enfermidade súbita, abandonou a via pública em direção ao Lar, seguido de perto pela figura espiritual supramencionada.

Enquanto o filho querido fatigava-se em meio à festividade, sua mãezinha rogava aos Céus a proteção do rebento, enquanto o aguarda, sentada em confortável poltrona na sala de sua residência, situada a alguns quarteirões do evento festivo. Apesar do mérito da mesma, era impossível que suas vibrações de Amor chegassem ao filho, diluindo-se, pouco a pouco, à medida que se aproximava da psicosfera doentia que dominava a avenida.

Chegando ao lar, Laércio ignora os braços estendidos de sua mãe, que exulta em alegria ao ver que seu filho está fisicamente perfeito, sem desconfiar da situação infeliz a que se vinculara. Alegando indisposição, o que seria compreensível após horas de folia, o rapaz banha-se e adentra o quarto para repousar. A entidade espiritual que o seguira até a residência, transmitindo a sensação de cansaço que acometia o jovem, deitara-se igualmente junto dele.

Diante das emanações fluídicas e dos quadros mentais emanados pela entidade, Laércio demonstra inquietação, virando de um lado para outro em sua cama, até que adormece de forma intensamente desconfortável. No estado lastimável em que se encontra, sequer separa-se do corpo físico no fenômeno abençoado do desdobramento, permanecendo junto ao corpo e com seu companheiro espiritual ao lado.

Pesadelos e visões perturbadoras assolam a mente de Laércio, que, mergulhado nas vibrações de pesado teor vibratório do espírito que adormece igualmente alienado ao lado, começa a captar tais emanações, sentindo todo o processo desencarnatório da figura espiritual.

Imaginou-se Laércio em larga calçada, num bairro desconhecido para ele, trôpego pela utilização de bebidas alcoólicas, cambaleante, a vociferar, socando o ar em sua volta, repetindo impropérios para todos que passavam a sua volta. E, ao tentar atravessar a movimentada avenida à sua frente foi atropelado por um veículo em alta velocidade, que chocou-se contra o rapaz, esmigalhando alguns ossos de sua perna, alçando-o a alguns metros do chão e disparando em seguida sem oferecer auxílio algum.

O choque fora demasiado violento para o frágil estado físico de Laércio, que desencarnara após forte impacto de sua fronte no asfalto. No entanto, continuava ligado ao corpo, já que não respeitara as Leis Divinas de conservação da máquina física e do respeito à vida, sendo considerado suicida indireto perante a própria consciência, onde estão gravadas as Leis Imutáveis do Criador.

Sendo assim, acompanhou todo o trajeto que seu corpo fez, abandonando a via pública aonde acontecera o desastre, diante da indiferença de alguns transeuntes e o inconformismo de outros, passando pelo exame pelos peritos médicos, sentindo o metal frio do bisturi a cortar-lhes as carnes, as agulhas a penetrarem em sua pele, costurando-lhe as feridas abertas.

Após tal terrível quadro, viu-se Laércio dentro de um caixão, com seus familiares em volta, questionando-se o porquê daquele pesadelo terrível, envolto em mil dúvidas, indagando a si próprio se os seus entes sentiriam sua falta ao constatarem sua morte, se os mesmos chorariam, sofreriam com a perda.

E, após ver seu corpo ser levado ao cemitério, observar o próprio enterro, onde a terra invadia a cova em que se encontrava o caixão, despertou empapado em suor, com os olhos esbugalhados e com o peito opresso de tanta amargura. Cheiro fétido de podridão envolvia o quarto. Intenso fervor acometeu-lhe a fronte, que parecia em brasas.

Tentou levantar-se, mas as dores em suas pernas eram insuportáveis. Chamou a mãezinha, que despertou assustada com o chamado, comparecendo ao quarto quase que imediatamente. Ao deparar-se com o filho querido naquele estado, sentiu o forte cheiro pútrido e reconheceu a presença da entidade infeliz que acompanhava o filho. Com intensa amargura a oprimir o peito, Dolores orou fervorosamente aos Céus, rogando a intercessão divina para aquele momento angustiante.

Nesse momento, adentra o quarto figura imponente, caracterizada por intensa luz, que ilumina todo o aposento. De sua fronte emitem-se raios luminosos de cores singelas, envolvendo todos os personagens de nossa trama. Dolores sente de imediato a presença de singular figura a envolver-lhe os pensamentos, proporcionando o reequilíbrio das forças mentais e preparando-se para comunicação psicofônica.

Depois desse ser iluminado, adentram outros espíritos, que cercam Laércio e o visitante espiritual, e iniciam uma aplicação de energias revigorantes, desligando os eflúvios de energia desequilibrada, substituindo-as por fluidos revigorantes, resultado do pensamento solidário e fraterno de seus emissores.

Dolores, após dar passividade ao ser de luz que a envolve, inicia transmissão de mensagem de amor, a qual alerta Laércio de suas condutas, suas companhias afetivas e os locais que freqüenta, demonstrando que a melhor proteção do ser encarnado é a oração e a boa conduta.

Finda a bela mensagem, o ambiente doméstico é higienizado pelas forças do Bem, que atuam em nome do Mestre Amado, levando a entidade perturbada e perturbadora numa espécie de maca alvíssima e deixando um leve aroma de éter no aposento, além de um sentimento Pacificado no coração materno tão dedicado ao filho querido.

Reflitamos, portanto, na importância de evitarmos a festividade referida na história acima, aonde se repetem essas e outras ocorrências menos ditosas, contribuindo para o acontecimento de tantos crimes, bem como na queda de seus integrantes no imenso abismo dos desvarios mentais, da expiação e da dor.

Que Jesus nos abençoe a marcha, para que sigamos-Lhe os passos, fiéis no servir, diminuindo as lágrimas e dores alheias e auxiliando o planeta a atingir novo patamar evolutivo neste Universo bendito oferecido por nosso Criador.