Bruno, palestrante espírita, ou seja, homem dedicado em divulgar o Espiritismo através de congressos, palestras e seminários, abordando diversos temas e enfatizando os ideais cristãos para solução dos problemas tratados em suas explanações, tornou-se célebre no meio espírita como excelente expositor das máximas espíritas-cristãs.
Como de costume, Bruno foi convidado a realizar uma dessas palestras numa cidade próxima de onde reside, localizada no interior da Bahia. De bom grado, aceitou, preparando-se previamente para o evento. Ao dirigir-se à referida cidade, hospedou-se em casa de um grande amigo, Jairo, o qual também era conhecido por tratar dos mais diversos temas concernentes ao Espiritismo.
Assim, às 20:00hs de uma terça chuvosa, Bruno postava-se defronte ao portão da residência do antigo amigo, apertando a campainha levemente para não incomodar a ninguém. Após alguns instantes, abre-lhe a porta Jairo, o qual reconheceu imediatamente o amigo e o abraçou, sinceramente feliz pela visita.
Após adentrar e informar como havia se passado a viagem, Bruno banhou-se e sentou-se ao sofá para conversar com seu amigo sobre as ocorrências da Vida, tão singelas e únicas para cada um deles. Foi então que nesse momento, Bruno percebeu que Jairo encontrava-se pensativo, com o olhar fixo ao teto, enquanto relaxava o corpo numa poltrona.
- Pensando em quê, amigo? - questionou Bruno.
- Oh! Desculpe-me, caro amigo, pela indelicadeza de deixar-te falando sozinho enquanto divago o pensamento em coisas banais... - desculpou-se, em resposta, Jairo.
- Jamais! Não se prive de compartilhar com seu amigo o que lhe preocupa! Vamos, diga! O que lhe aflige?
- Na verdade, irmão, nada me aflige. Estou apenas a refletir sobre uma ocorrência que me surpreende por esses dias.
- O que houve? - perguntou Bruno, movendo-se ligeiramente para frente, de forma a ficar mais próximo ao amigo.
- Veja só. Todos os dias, ao me dirigir à padaria situada a algumas quadras daqui, acabo passando por uma banca de jornais, onde sempre compro a edição diária do jornal da cidade. O jornaleiro, o sr. Edilson, sempre foi afável e atencioso comigo, tratando-me como um cliente antigo. - até esse ponto, Jairo sorria - Ocorre que, de tempos para cá, o Sr. Edilson começou a me tratar com uma rispidez tremenda, chegando a jogar o jornal em minhas mãos, com total desconsideração. - terminou Jairo com a face já sem o sorriso costumeiro, mas sem afetação, apenas mantendo um semblante sério e preocupado.
- Ora! Que desleixo! Como pode um comerciante tratar dessa forma um cliente já antigo? - protestou Bruno, indignado com a situação vexatória a que estava passando o amigo. - Pois amanhã lhe acompanharei para constatar esse fato!
- Sim, iremos. Já estava com a intenção de convidar-lhe. Preciso de outra opinião sobre essa problemática. - finalizou Jairo - Mas não vamos nos ater a esse tema. Deixemos para amanhã! Mudemos de assunto. (...)
E assim se passaram algumas horas, onde ambos trocaram experiências e opiniões sobre outros assuntos.
No dia posterior, no horário aprazado, seguiram Jairo e Bruno para a padaria, passando primeiro na banca de Jornais do Sr. Edilson. Sob a orientação da noite anterior, Bruno resolveu manter-se um pouco afastado para assistir à cena com todos os seus detalhes. Jairo, como de costume, se dirigiu normalmente ao jornaleiro.
- 'Dia, Sr. Edilson! - disse Jairo, direcionando a mão direita para cumprimentar o comerciante.
A resposta, porém, veio seca e de malgrado por parte do Sr. Edilson, que nem ao menos levantara a cabeça para receber o antigo cliente, limitando-se a continuar analisando as páginas de uma revista à sua frente.
- A edição do dia, por favor. - requereu Jairo, serenamente, fingindo não haver notado a indelicadeza do ouvinte e depositando o valor do jornal na bancada aonde o jornaleiro estava sentado.
Bufando como um touro e com o aspecto mal-humorado, Sr. Edilson levantou-se de má vontade, agarrou uma edição do jornal local recebida aquela manhã e jogou-a às mãos de Jairo, fazendo-o praticamente abaixar até o chão para alcançar o objeto lançado.
Bruno quase não podia acreditar na cena, de tão infeliz que era. Indignado, balançava a cabeça, olhando aquele indivíduo tão amargurado.
Seguiram ambos o caminho programado sem comentar por alguns minutos o ocorrido. A certa altura, no entanto, Bruno não se conteve e exclamou:
- O amigo realmente disse a inteira verdade quando tratou da ocorrência. O jornaleiro efetivamente age com total indelicadeza para com você, amigo!
- Você constatou o mesmo, não foi, Bruno? Pois então. Esse é o meu dilema atual. A causa dessa amargura!
- Mas, amigo, porque continuas a comprar as edições diárias junto a este comerciante, se o mesmo lhe trata com tanto desprezo? Tu ainda continuas a lhe dar dinheiro?
- Ora, Bruno, veja bem. Não irei alterar a minha rotina por conta de uma atitude infeliz de outrem. É mais vantajoso para mim comprar nessa banca pois é a mais próxima de minha casa e corta o caminho para a padaria. Não irei buscar outros meios para adquirir a edição diárias apenas porque um indivíduo encontra-se em conflito interior. O desequilíbrio alheio jamais deve interferir em nosso estado de coisas.
A sabedoria daquelas palavras não ensejaram a Bruno mais questionamentos e o assunto não rendeu quaisquer comentários posteriores. A conduta do amigo serviu de lição eterna para Bruno, o qual compreendeu a importância de mantermos nosso estado íntimo equilibrado, ainda que o Mundo exterior apresente-se totalmente desequilibrado e infeliz.
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A história retratada nas linhas anteriores é verídica e é contada por um expositor espírita muito respeitado: Flávio Santos. A sua experiência nos serve de lição elevada acerca da manutenção do estado íntimo elevado, consciente e equilibrado.
Ainda que os seres que nos rodeiam apresentem problemas e disfunções comportamentais que nos ofendam, devemos buscar o esquecimento dessas atitudes e a busca da renovação íntima. Jamais devemos alterar nossas condutas ou escolhas elevadas por conta do desequilíbrio alheio. Se assim o fosse, Jesus não se manteria firme nos seus ideais, quando toda uma sociedade objetivava fazê-lo pensar diferente.
Mantenhamos, dessa forma, o pensamento em Cristo, sabendo que as nossas condutas e escolhas no Bem irão sempre trazer desconfiança e estimular a maledicência alheia, os quais nunca estarão satisfeitos enquanto não nos transmitirem os seus desequilíbrios. O importante, porém, é mantermos essa sintonia elevada, apesar de tudo e de todos, pois daremos conta ao Pai Eterno das escolhas que tomamos na Terra e especialmente do que fizemos para o próximo.